[Actualização: foi hoje também notícia no Público]
Foi postado recentemente no blog Aventar um post do professor de história do ensino secundário João José Cardoso intitulado "Quando os animais escrevem manuais", e no qual o autor manifesta a sua repulsa por um exercício de um livro de Físico-Química do 9º ano (Zoom, Areal Editores), sendo o cerne do problema o lançamento de um gato de uma altura de 5 metros.
Foi postado recentemente no blog Aventar um post do professor de história do ensino secundário João José Cardoso intitulado "Quando os animais escrevem manuais", e no qual o autor manifesta a sua repulsa por um exercício de um livro de Físico-Química do 9º ano (Zoom, Areal Editores), sendo o cerne do problema o lançamento de um gato de uma altura de 5 metros.
No mesmo post, destila fel pelos presumíveis autores do exercício, os quais refere pelo nome, lamentando a impossibilidade de os poder largar de uma janela abaixo, acto que o autor presume que fosse causar danos substanciais (ao piso, claro está) pela densidade do "calhau rolado" que presume possuírem (confesso não conhecer a expressão, só os propriamente ditos). No chorrilho de comentários ao post incendiário, alguns do próprio autor, sobe-se a fasquia: os autores são agora bestas, dever-se-ia atirá-los e medir a profundidade do buraco no chão.
O exercício polémico |
Segundo o autor, apela-se neste exercício ao incumprimento de uma lei. Não vejo como, confesso, já que sendo claramente ilegal atirar um animal de uma janela, não vejo que o exercício faça qualquer apelo nesse sentido. Carecerá este livro de um disclaimer à laia de "nenhum animal foi magoado na escrita deste manual"? Ou "não tentem isto em casa"? Porventura considerará o autor mais benigno incitar à violência contra autores de manuais escolares, pessoas que existem, de facto, com direitos (inclusive ao bom nome) que alguém que presumo de esquerda deveria ter na mais alta consideração?
É assustador como um simples exercício num manual (ainda que um tanto ou quanto infeliz) de imediato faça com que estes professores, e colegas do autor do post, passem a "bestas". Já vi este exercício de alterização por estigmatização 'do outro', e das consequências que pode ter, como é o caso dos ataques (na forma tentada, concreta e até virtual) a investigadores que usam animais nas suas experiências. Se estas pessoas forem apresentadas como sub-humanos, haverá quem não veja problema em tratá-los da mesma forma.
É assustador como um simples exercício num manual (ainda que um tanto ou quanto infeliz) de imediato faça com que estes professores, e colegas do autor do post, passem a "bestas". Já vi este exercício de alterização por estigmatização 'do outro', e das consequências que pode ter, como é o caso dos ataques (na forma tentada, concreta e até virtual) a investigadores que usam animais nas suas experiências. Se estas pessoas forem apresentadas como sub-humanos, haverá quem não veja problema em tratá-los da mesma forma.
E, ainda que de mau-gosto, será tão desumano o exercício em questão? É de notar que:
- Há um problema clássico da Física relacionado com o modo dos gatos caírem "de pé" *
- A imagem ilustra o righting reflex, mostrando que o animal cai com as quatro patas no chão.
- Uma queda desta altura em princípio não teria consequências de maior para o animal (mas por favor não tentem isto em casa, OK?) **
- É um gato hipotético. Get over it.
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*[Mas não é o caso do exercício apresentado, que é somente um problema de queda de graves]
Há uma aparente contradição do princípio da conservação do momento angular, pois o gato começa com momento angular zero, mas roda 180º, quando o momento angular deveria continuar a ser zero durante a queda. Isto explica-se pelo facto de um gato não ser um sólido inerte e ter ossos e músculos cuja acção conjunta permite exercer a necessária torção. O popular podcast "Smarter Everyday" exemplifica esta experiência neste vídeo.
Há uma aparente contradição do princípio da conservação do momento angular, pois o gato começa com momento angular zero, mas roda 180º, quando o momento angular deveria continuar a ser zero durante a queda. Isto explica-se pelo facto de um gato não ser um sólido inerte e ter ossos e músculos cuja acção conjunta permite exercer a necessária torção. O popular podcast "Smarter Everyday" exemplifica esta experiência neste vídeo.
** Mais intrigante ainda é o facto de ser mais seguro para um gato cair de alturas superiores a sete andares. Presume-se que o seu rácio peso/área de superfície em queda (ao estenderem o corpo como "pára-quedas") lhes permita uma velocidade terminal não fatal, como ocorre com os esquilos-voadores. Isto, associado à combinação de flexibilidade, força e leveza das suas patas (que permite dissipar muita da a energia do impacto), leva a que possam cair de dezenas de andares de altura, ainda que frequentemente com mazelas a merecerem atenção de um veterinário.